Nesta partilha olho no olho, não deixamos a afetividade esfriar
Hoje, saímos da esfera privada e optamos por refeições práticas nos restaurantes. “De certo modo, acabamos mantendo o foco na comida, que merece até foto antes de ser consumida”, pondera Mariana. Essa obsessão pelos pratos e pelas redes sociais destitui a refeição compartilhada do olho no olho, da atenção ao outro, do prazer de sentar à mesa com gente querida. Faz do menu um troféu social, um símbolo de status. Em casos extremos, esse novo jeito de saborear pode favorecer distúrbios alimentares e uma seletividade exacerbada de frutas, legumes ou carnes em um contexto privilegiado de abundância.
Na Grã-Bretanha, a agência de estudos de mercado Mintel publicou uma pesquisa curiosa sobre o tema. Nos últimos cinco anos, a venda de mesas de jantar caiu 8% entre os britânicos, ao passo que a de móveis de escritório subiu 40%. Cerca de 25% da população não tem um móvel próprio que possa fazer uso para jantar em casa. Entre os que têm, menos de um terço ainda o utiliza em ocasiões especiais, como o Natal e o Ano Novo. Para os pesquisadores, os divórcios e a falta de tempo da vida urbana seriam as principais justificativas para o abandono desta peça tão simbólica do nosso mobiliário doméstico.
Uma revista pediátrica americana publicou um estudo com 4.746 jovens de 11 a 18 anos. Os que comiam em família com frequência se mostravam menos propensos a fumar, beber e usar drogas. A pesquisa indicou também uma menor incidência de depressão e de pensamentos suicidas entre as crianças e adolescentes que comiam com os pais, além de melhores resultados na escola.
Para o crítico e ativista culinário americano Michael Pollan, autor de Cooked: A Natural History of Transformation (Cozido: A História Natural da Transformação, em tradução livre), a refeição familiar é o berço da democracia. É o momento em que a criança aprende a compartilhar, a esperar a sua vez e a argumentar sem brigar.